Saiba mais sobre tudo que rola no mundo da pecuária!
Publicado em 15/07/2021
Por: William Koury Filho
Caros leitores, dando continuidade à temática “reprodutores”, mantenho o debate sobre os protagonistas que, por vezes, já estiveram presentes neste espaço. Não poderia ser diferente em função do impacto genético que exercem nos rebanhos. O touro utilizado em monta natural pode cobrir cerca de 30 matrizes por estação; na inseminação artificial (IA), bons touros de central podem produzir sêmen suficiente para emprenhar milhares de fêmeas em um único ano.
A prosa de hoje é justamente sobre os touros de central, já que, há duas semanas, estive visitando as maiores centrais de coleta de sêmen do país. A primeira constatação é que, neste excelente momento da pecuária e com as perspectivas favoráveis para o futuro, as centrais estão lotadas, com muitos touros contratados pelas empresas e outros tantos de particulares como prestação de serviço. O título provocativo “ESTÁ BAGUNÇADO” faz referência à diversidade de tipos nos touros que encontramos da raça Nelore. Tem para todo gosto: alto, baixo, grosso, fino, costeludo e pernalta. Têm ainda feios ou bonitos de raça, bons de aprumos ou fracos para essa característica funcional. Enfim, tem para todo gosto.
Quando digo “está bagunçado” me refiro à falta de padrão. Deixe-me explicar melhor: frequento centrais de inseminação artificial desde menino, e hoje, com 50 anos de idade e 26 como zootecnista, digo que nunca houve tanta diversidade de tipos e poucas marcas com muitos representantes. Quando a seleção se utilizava mais do olho, os touros de central tinham maior identidade, um padrão fenotípico. Para resumir a linha do tempo, a pista foi uma grande referência nas décadas de 1970, 1980 e 1990, momento em que já dividiam um pequeno espaço com touros que poderiam ser chamados de “alternativos” – como os da linhagem IZ ou Lemgruber. Nos anos 2000, já era mais comum touros oriundos de programas de melhoramento, inclusive os CEIPados em maior número nas centrais. Ainda assim, eu via uma exigência maior com relação ao fenótipo, pois hoje os números têm roubado a cena, olhar para as avaliações genéticas dos reprodutores se tornou mais importante do que olhar o próprio touro.Isso é ruim ou bom?
Penso que uma raça deve ter identida-de/padrão, mas, acima de tudo, deve ser produtiva para que seja competitiva. De-vemos lembrar que o Nelore dominou a pecuária nacional em função de sua fertilidade, que tem a ver com adaptação, que podemos chamar de rusticidade. Isso mesmo, capacidade de parir um bezerro vigoroso, dar leite e emprenhar novamente. No melhor dos mundos, temos que buscar manter a rusticidade e evoluir em fertilidade, tipo frigorífico, precocidade, produtividade e eficiência alimentar sem perder em padrão racial.
Em um passado recente não havia touros tão desarrumados em central, e, se hoje existem alguns tantos, é porque o mercado está comprando e realmente eles podem ter algo a acrescentar. Confesso que tenho me preocupado com a perda de padrão racial e com os aprumos, mas minha preocupação maior é com a conformação frigorífica fraca em touros mais pesados de frente e/ou com pouco posterior, ou da bitola exagerada – mas com números atrativos.
E aí está um dos problemas, quando falo em números atrativos, estou me refe-rindo principalmente aos índices nos programas de melhoramento. Esses têm sido a grande ferramenta comercial e, como já explicado em colunas anteriores, os índices não te explicam as partes, é necessário interpretar as avaliações de cada característica. Os índices, principalmente em gado PO, não necessariamente direcionam para um tipo forte para conformação frigorífica. Diferente da padronização de carcaça que encontramos em frangos e suínos, os atuais touros Nelore nas centrais apresentam grande variabilidade de tipo, o que, em parte, poderia ser explicado pela di-versidade de ambientes de criação.
O pior é que vi também touros que não apresentam nem números atrativos, nem biotipo, alguns nem eram bons de raça, sem sentido algum de estarem por lá – animais para prestação de serviço, o que demonstra a existência de criadores total-mente sem rumo. Seleção baseada só no olho não faz sentido nos dias atuais, mas os índices genéticos e genômicos não devem ser interpretados como verdades absolutas e como adequados para qualquer realidade – embora representem o avanço da ciência, evoluem e devam ser respeitados.Minha formação é científica, mas me criei na fazenda vendo gado.
Quando fiz doutorado palestrava muito pelo Brasil para disseminar a importância das avaliações genéticas, mas a utilização comercial exagerada dos índices genéticos me faz pensar se a “bagunça” de tipo que vi nas centrais é para o bem ou para o mal.
Em religião, ética e filosofia, o bem e o mal referem-se à avaliação de objetos, desejos e comportamentos através de um espectro dualístico, onde, numa dada direção, estão aqueles aspectos considerados moralmente positivos e, na outra, os moralmente negativos. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra, creio que chegaremos na virtude do equilíbrio.
Vamos que Vamos!